Fracasso das operações milionárias pagas pelo governo federal se junta à inoperância da CDP e Porto de Vila do Conde entra em declínio, inclusive com interdição de alguns trechos.

A incompetência falou mais alto – e não há sinais de retorno. O governo federal investiu cerca de R$ 60 milhões – há controvérsias – na tentativa de reflutuar a embarcação de bandeira libanesa conhecida como NM “Haidar”, que afundou no Porto de Vila do Conde, em Barcarena, Região Metropolitana de Belém, no dia 6 de outubro de 2015. O navio, considerado um “popopô” na comparação com os demais que operam na região, transportava carga viva – mais de 5 mil cabeças de boi – e perigosa – cerca de 700 toneladas de óleo para a Venezuela.
Nada foi recuperado da carga, muito menos a embarcação, mas os prejuízos ambientais para a região podem ser medidos pelas indenizações estimadas pelos danos ambientais, da ordem de mais de R$ 70 milhões. Os danos impostos às populações da região foram imensuráveis do ponto de vista do fator humano e sequer se sabe se foram pagos. Sabe-se, de concreto, que as águas do rio Pará se encarregaram de dar destino à carga morta e derramada, enquanto o navio, antes uma mera peça naufragada, virou parte do leito do rio – argiloso e ardiloso -, incrustado em terreno onde poucas dragas alcançam.
Incúria e incompetência
Nesse período, quase dez anos depois, o Haidar poderia ter sido recuperado não fosse a incúria e a incompetência dos governos brasileiros – não importa a cor -, ainda que para servir de berçário à fauna marinha duzentos metros distante do cemitério impenetrável em que se encontra. É o que costuma acontecer em qualquer parte do planeta, afinal.
O Dnit, por exemplo, investiu cerca de R$ 60 milhões, por baixo, para tentar a reflutuação do navio, e até anunciou um suposto sucesso da operação, mas foi apenas uma expectativa levada pelas águas do rio Pará – até porque nem “conversa para boi dormir” caberia nesse cenário grotesco.
Bateu em retirada
Para se ter ideia, sete anos depois do naufrágio, a empresa vencedora da licitação aberta pelo governo federal para a operação de reflutuação – a Superpesa -, que havia recebido R$ 40 milhões pelo serviço que acabou não concluindo, pediu um aditivo de R$ 20 milhões, mas bateu em retirada, depois de desmobilizar equipamentos usados na operação frustrada
Para Barcarena, túmulo do Haidar e de mais de 5 mil cabeças de gado, a contagem dos prejuízos da tragédia parece não ter fim: o píer onde o navio naufragou continua interditado e inoperante, o que representa tempo e dinheiro, mesmo em um país de governo perdulário e população pobre, pobre de marré.
Prejuízos acumulados
Conforme declaração do presidente da Companhia Docas do Pará à época, Parsival Pontes, “os prejuízos têm sido grandes por causa da interdição de um berço e meio do porto. Isso trouxe uma perda de receita mensal. Se esses dois berços de atracação estivessem operando, estaríamos faturando mais de R$ 250 mil a R$ 300 mil por mês”. Àquela altura, dois anos depois da tragédia, o leporino Porto de Barcarena contabilizava prejuízo de cerca de R$ 7 milhões por mês, e faltava dinheiro para a reflutuação, avaliada em R$ 60 milhões.
Além disso, dentro da regra segundo a qual “desgraça só quer começo”, habitantes da área de influência do rio Pará encharcados de bois mortos por afogamento sofriam as agruras do infortúnio criado pela tragédia. Não se distinguiam nem a cor do rio e nem o gosto das águas contaminadas da região. Eram os impactos ambientais e sociais na comunidade.
Danos irreparáveis
Os animais que estavam a bordo morreram afogados, muitos presos na embarcação. O banho nas águas foi proibido e o movimento de frequentadores das praias de Barcarena, Abaetetuba e ilhas vizinhas caiu. Pescadores também não puderam mais retirar o sustento dos rios. Vários laudos comprovam danos sociais e ambientais do desastre, com o valor mínimo das indenizações na casa dos R$ 70 milhões. A expectativa era de indenização de 1,5 mil famílias, mas essa alternativa também acabou afogada pela incompetência federal.
Bem verdade que a literatura se refere a um acordo chancelado pelo Ministério Público Federal celebrado em fevereiro de 2018 – processos 35481-71.2015.4.01.3900 e 14725-07.2016.4.01.3900 -, que tinham como tema os impactos decorrentes do naufrágio da embarcação Haidar, mas, dele, nada mais se sabe.
E o Brasil e suas instituições seguem altaneiros, gastando o que podem e o que não podem e acendendo vela para bois afogados, como que a dizer “o que passou, passou…”
Inoperância da CDP e Porto de Vila do Conde dominam reuniões da autoridade portuária.
As duas últimas reuniões do Conselho da Autoridade Portuária, em dezembro e janeiro, foram marcadas por críticas e cobranças à Capitania dos Portos do Pará. Em ambas, a peça de resistência foi a ineficiência da atual gestão e o Porto de Barcarena, pela interrupção, nesses últimos dez anos, do berço 302, cemitério do navio Haidar e de dinheiro público.
De um modo geral, os conselheiros criticam a gestão dos portos pela atual pela falta de planejamento e de investimento em infraestrutura, comparando com outros portos do País. A situação, inclusive, chegou à Antaq, que estaria em busca de estratégias para identificar e demandar melhorias na infraestrutura nos portos paraenses. “O mercado tem reagido negativamente aos problemas e à falta de perspectiva de melhorias no Estado” ante as informações de que “empresas de Barcarena estão trocando o Porto de Vila do Conde, em Barcarena, pelo Porto de Pecém”, na Grande Fortaleza, Ceará, disse um conselheiro.
“Ano passado”, apontou outro conselheiro, “a CDP apresentou lucro, mas a razão foi a falta de execução orçamentária, que deixou em caixa dinheiro que deveria ter sido investido”. A Companhia detém a menor faixa de investimentos na infraestrutura portuária do País e tem sido criticada pela “centralização de decisões da presidência e morosidade nos processos”, o que deverá provocar prejuízos.
Sem saída aparente.
A reunião de janeiro voltou a bater na tecla do navio Haidar, mas as soluções ou parecem cada vez mais distantes ou simplesmente perderam o rumo. Os impactos da obstrução do berço 302 causados pelo naufrágio resultam em prejuízos tanto para a CDP quanto para o mercado, por conta do tempo maior de espera das embarcações para embarque e desembarque. Não bastasse, houve redução nas operações nos berços 202 e 402.
Nesse ponto, a sugestão dos conselheiros aponta para a necessidade de a CDP, ante a falta de ação e de poder de negociação para estimular novas operações de resgate do navio, se dirigir diretamente ao Ministério dos Transportes, uma vez que o impacto financeiro nesses 10 anos não será recuperado.
A ideia é levar a situação para o âmbito do governo federal por se tratar de uma questão complexa, sem falar que o Porto de Vila do Conde passou mais de cinco anos sem os alvarás dos bombeiros e da Prefeitura de Barcarena e quase perdeu o alfandegamento, o que reforça o caráter de ineficiência da administração da CDP.
Interdição do porto
Para quem duvidava do Conselho da Autoridade Portuária, a semana começou com o pedido de interdição de trechos do Porto de Vila do Conde, onde o Ministério Público do Trabalho identificou falhas de manutenção na estrutura que ameaçam a segurança de usuários e trabalhadores. A CDP, por sua vez, se posiciona atribuindo a culpa à gestão anterior da companhia, alegando que “obedece às normas legais de operação portuária e que as providências cabíveis já estão sendo tomadas, dentro dos prazos estabelecidos”.
Por Portal da Navegação, via Portal Olavo Dutra.
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