Ataque de ‘Piratas dos Rios’ desafia poder das autoridades no Amazonas.

Base Arpão é uma das estratégias do Governo Estadual para frear as atividades ilegais no Amazonas

Rosana Ramos – 18/01/2025.

ito pessoas de uma mesma família, incluindo um bebê de oito meses, foram mantidas em cárcere privado por “piratas dos rios”, na última segunda-feira (13). Ataques a embarcações, geralmente feitos com bastante violência, evidenciam graves problemas enfrentados pela população ribeirinha. Muitos desses crimes são capitaneados pelo narcotráfico e garimpo ilegal. Para a Segurança Pública, o desafio é desmontar um esquema criminoso que fatura milhões por ano com o crime organizado e proteger a região.

Com rios extensos e, muitas vezes, sem intensa movimentação, a criminalidade aproveita de certas oportunidades para amedrontar os moradores, agindo acima da Lei. Um dos casos de maior repercussão é o duplo homicídio do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Philips, ocorrido em Atalaia do Norte.

Mortos em 2022, a dupla era engajada em defender os direitos dos povos indígenas e proteger o meio ambiente, mesmo sob ameaças de criminosos. Dom estava na região para escrever um livro sobre como salvar a floresta, mas já havia feito reportagens sobre os crimes na região, o que resultou na morte dos dois profissionais. Na época, o duplo homicídio serviu para dar um recado à população: nem sempre a segurança chega a todos os cantos dos Estados.

A impunidade e violência também apresentam outros traços na região, como os ataques de piratas, que desafiam as autoridades locais.

Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM), de 2020 a 2022, cerca de 128 ocorrências de ataques de piratas foram registradas pela Polícia Civil do Amazonas. Esse levantamento reflete os crimes ocorridos no Rio Solimões, no trecho entre os municípios de Tefé e Coari.

Zona de perigo

Foto: Reprodução

Três anos depois, a região ainda é alvo da ação de criminosos dos rios. Na última segunda (13), a polícia recebeu uma denúncia informando que um barco pesqueiro havia sido abordado por um grupo de piratas nas proximidades da Ilha da Botija, em Coari. No local, cinco suspeitos faziam uma família de oito pessoas reféns, e os criminosos estavam a procura de uma suposta carga de drogas.

Ao perceberem a aproximação policial, os suspeitos atiraram contra os agentes de segurança e ainda conseguiram fugir por uma área de mata. Todos os reféns foram resgatados e levados à delegacia para prestarem depoimento.

A região de Coari é vista como uma “zona de perigo” para quem trabalha com o transporte fluvial. Ao Em Tempo, o profissional Romulo França, da empresa DF Navegação, contou que nunca presenciou um ataque de pirata, mas que já foi alertado sobre os perigos que rondam municípios amazonenses.

“Nosso trajeto é Manaus-Codajás-Coari-Tefé, depois disso a gente volta, porque nossa rota é Manaus-Tefé, mas damos uma parada em Coari e também Codajás. Só ouvimos falar sobre [os ataques de piratas]. Geralmente, segundo ouvimos, ocorre perto de Coari”, relatou o profissional.

Já o pescador Evandro Maia, residente do bairro Puraquequara, em Manaus, conta que atualmente não tem ouvido relato sobre ação de criminosos nos rios dos arredores da capital, mas a situação era diferente há mais de um ano.

“Eu sei que existe, teve um período aí que aqui estava perigoso, os ‘piratas dos rios’, a gente não podia sair para pescar, principalmente se fosse motor de popa, no caso, que nem o meu, era esse que era a preferência deles”, afirmou o pescador.

A insegurança em viajar pelos rios do Amazonas, em meio aos relatos de violência, levaram os trabalhadores fluviais a reforçar o esquema de segurança dos próprios barcos.

“Na realidade, a maioria das embarcações tem segurança particular armada entre os passageiros”, destacou Romulo França.

Seca histórica

Foto: Defesa Civil/Envira/Divulgação

Além do clima de insegurança, um agravante prejudicou ainda mais o transporte hidroviário no Amazonas nos últimos dois anos: a seca severa que atingiu o Estado.

Muitos piratas se aproveitavam do momento em que as embarcações atracavam durante a noite, devido aos perigos noturnos de navegar durante a estiagem, para atacar a tripulação e passageiros.

Em 2023, o presidente do Sindicato das Empresas de Navegação Fluvial no Estado do Amazonas (Sindarma), Galdino Alencar Junior, destacou que as embarcações se tornam alvos fáceis de criminosos nessa perspectiva.

“Tivemos casos de embarcações que foram assaltadas à noite, enquanto aguardavam para voltar a navegar durante o dia. A seca é um agravante, a gente fica mais vulnerável. […] Os piratas ameaçam explodir balsas quando tem muita retaliação. No dia que explodir balsa, e os holofotes do mundo se voltarem para cá, vão ver a realidade do Amazonas”, denunciou o representante.

Segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), de 2020 a 2023, a atividade ilegal gerou um prejuízo de R$ 100 milhões no transporte de cargas no estado.

Reforço na segurança

Foto: Divulgação/MJSP

E para reprimir a onda de violência no Rio Solimões, a Justiça do Amazonas determinou, na última sexta (10), que o Governo Estadual tome providências contra os ataques de piratas dos rios em Coari. Entre os pontos abordados na decisão está o aumento do efetivo em 40 militares, além do que já está lotado atualmente em Coari, no prazo de seis meses; a disponibilização para a PM em Coari, no mínimo, de duas lanchas rápidas, equipadas com dois motores de alta potência, equipamentos de comunicação, suportes para armamentos de grosso calibre e sistema de blindagem, com prazo máximo de seis meses.

Também consta a manutenção e disponibilização de cota de combustível mensal adequado para as 13 viaturas — seis carros e sete motocicletas — e da lancha rápida do 5º BPM; a também disponibilização para a PM de duas carretinhas para transporte das lanchas rápidas; e a disponibilização para o 5º BPM de armamentos não letais suficientes para a preservação da ordem pública na localidade.

Estratégias de segurança

Foto: Divulgação

Como estratégia para combater a criminalidade no Estado, por meio do investimento do Governo do Amazonas, as Forças de Segurança a partir de ações das Policiais Militar e Civil têm aumentado o patrulhamento nos rios com apoio de lanchas blindadas e armamentos de grosso calibre, além de abordagens permanentes a partir das Bases Fluviais Arpão 1 e 2, Tiradentes e a Governador Paulo Pinto Nery, que estão instaladas em Coari, Barcelos, Santo Antônio do Içá e em Itacoatiara, onde as ações impactam diretamente nos municípios adjacentes.

De acordo com a secretaria, as ações nos últimos quatro anos geraram danos ao crime superiores a R$ 2,9 bilhões, sejam, com apreensões de entorpecentes, embarcações, minério, caças e pescado. Durante esse período cerca de 3.225 prisões foram registradas e mais de 25.715 mil munições e 1.806 armas de diversos calibres, dentre eles submetralhadoras e fuzis foram apreendidos.

Além disso, as Forças de Segura ganharam reforço no efetivo com o chamamento de 1.704 aprovados em concursos da área de Segurança Pública. A ação representa um investimento do estado de R$ 12 milhões por mês. Os aprovados prestaram concurso em 2022, 11 anos após último certame para as forças de segurança realizado pelo Estado.

Por Portal da Navegação, via portal EM TEMPO.