Mudanças climáticas devem atrasar recuperação da navegabilidade no Amazonas, alerta Sindarma

Hector Muniz – Da Revista Cenarium

MANAUS (AM) – A seca severa que fez o rio Negro registrar o menor nível em mais de cem anos ainda deverá insistir no decorrer de 2024. A expectativa é do Sindicato das Empresas de Navegação Fluvial do Amazonas (Sindarma), que alertou que mesmo com o retorno das chuvas, os “índices ainda são insuficientes para assegurar condições normais de navegabilidade no início do verão“.

“Acabamos de sair de uma seca recorde e devemos nos preparar para enfrentar outra crise em 2024, caso permaneça a tendência fluvial que estamos observando. Apesar do retorno das chuvas, os índices ainda são insuficientes para assegurar que no início do verão teremos condições normais de navegabilidade”, afirmou o presidente do Sindarma, Galdino Alencar, durante reunião com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação (Sedecti).

Imagem colorida mostra uma apresentação para um público de dezenas de pessoas em um auditório. Na foto, Galdino Júnior discursa.
Galdino Júnior do Sindarma apresentou levantamento no dia 31 de janeiro. (Divulgação)

O geólogo e consultor ambiental independente, Jorge Garcez prevê que neste ano o Amazonas não deverá enfrentar seca ou cheia severa por conta de uma transição do El Niño para La Ninã. As consequências do El Niño são várias: altera a vida marinha no Oceano Pacífico, aumenta as chuvas na América do Sul e em parte dos Estados Unidos, intensifica as secas no Nordeste do Brasil, provoca fortes tempestades no meio do Oceano Pacífico, entre outras consequências.

Seca no lago do Aleixo em Manaus (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium Amazônia)

Durante o La Niña também acontecem vários efeitos: a região Centro-Oeste do Brasil fica mais fria durante um rápido período, chove muito no Nordeste, o verão fica mais frio.

“A gente deve passar esse ano por uma transição entre o El Niño e a La Niña que deve criar corpo em 2025. Então, esse ano, não devemos ter nem uma cheia extrema e nem uma seca extrema. A gente deve ficar em uma cota padrão dos sistemas dos rios amazônicos”, espera Garcez.

Efeitos devastadores

No dia 5 de outubro do ano passado, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, declarou que o El Ninõ de 2023 era atípico em razão das mudanças climáticas, o que gerou “efeitos devastadores”, referindo-se diretamente à severa estiagem que atinge a região Norte. A fala ocorreu durante o 7⁰ Fórum Nacional de Controle do Tribunal de Contas da União (TCU).

Nesse ano, os rios do Amazonas registraram estiagens históricas. No porto de Manaus, onde é calculado o nível do Rio Negro, no dia 26 de outubro o nível do rio que banha parte de Manaus atingiu a marca de 12,70, a maior seca em mais de 100 anos.

Começamos o ano com chuvas torrenciais na Amazônia, particularmente no Acre, no Amazonas e em Rondônia, e secas no Sul do País. Nós estamos encerrando o mesmo ano com chuvas torrenciais aonde era seco e seca insuportável aonde tivemos enchente. O que sobrou da enchente vem a seca e leva e o que sobrou da seca vem a enchente e leva. Isso são os eventos extremos. De fato, o El Niño é um fenômeno natural, mas está potencializado pela mudança do clima e essa potencialização está levando a efeitos devastadores“, disse a ministra a época.

Um estudo realizado pela World Weather Attribution (WWA), grupo internacional de cientistas especializados em pesquisas sobre o clima, que reúne o Brasil, Reino Unido, Holanda e Estados Unidos, mostra que a estação de estiagem de 2023 provocada pelo El Niño foi mais seca e mais longa do que o normal, fazendo com que os rios atingissem níveis tão baixos.

Os cientistas do WWA constataram que a mudança climática está reduzindo a precipitação e aumentando o calor na Amazônia, o que foi responsável por tornar a estiagem sem precedentes de 2023 cerca de 30 vezes mais provável do que ocorreria apenas pela ação do El Niño.

“À medida que o clima se aquece, uma potente combinação de diminuição da precipitação e aumento do calor está impulsiona a seca na Amazônia”, disse a pesquisadora Regina Rodrigues, professora de Oceanografia Física e Clima da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e que fez parte da equipe que conduziu o estudo.

Boto morto em lago no município de Tefé, interior do Amazonas (André Kumark/Instituto Mamirauá)

Especialistas apontaram que o Amazonas pode voltar a sofrer eventos extremos climáticos como foi o caso da seca, mas de forma mais pontual e tênue. O geográfo e diretor da Wildlife Conservation Society (WCS-Brasil) no Amazonas, Carlos Durigan, afirma que o planeta alcançou um processo de aquecimento irreversível por conta de atividades humanas.

“Tem relação diretas com atividades humanas, de omissões, principalmente relacionado também a atividades produtivas, que elevam também o desmatamento e a degradação. Então o cenário é bastante ruim do ponto de vista climático e nós já estamos em um processo de aquecimento global irreversível”, analisou.

Preservação

Recentemente, um levantamento realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) registrou a queda de 73% no desmatamento nessas zonas do bioma. O resultado é da comparação entre 2023 e 2022. Para a diretora de estratégia da World Wildlife Fund Brasil (WWF Brasil), Mariana Napolitano, as áreas protegidas são fundamentais na adaptação aos fenômenos climáticos.

“São ferramentas importantes no combate ao desmatamento, não só com a emissão de mais carbono, mas também na adaptação das mudanças climáticas“, destacou.

Por Portal da Navegação, via REVISTA CENARIUM